terça-feira, 31 de maio de 2011

Pode não - a menina e o moço

Pode não ser tanto o teu querer
Cabe não ser pranto a minha saudade
Na verdade entre tanto bem dizer
Há de haver um quê de canto na vontade

Pode não ser louco teu amor
Tende não ser pouca a minha loucura
Na vaidade de um réles escritor
Há de ter o teu afago como cura

Pode não ter ponto a nossa vista
Perde o realista que não sonha como nós
Na distância que emerge o otimista
Há de ser o meu soneto a tua voz

Pode não ter fim e nem começo
Desde que por entre estejamos
Na história de amar os teus avessos
Há de ter seu eu em meus meandros

Norhan Sumar

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Velhosidade

                                                           Foto: Fabiano Mazzoco
As marcas impiedosas do tempo davam ao seu rosto o recado da vida sofrida e dos anos árduos de um passado cuja preocupação com a pele era privilégio dos fabricantes de casaco com a de algum animal.
Sentado, observando o tempo passar com suas pernas inúmeras, algumas como as dele, outras mais calmas e lentas, sequer percebia o presente, sequer conhecia algum tempo verbal que não o conjugado no passado. Pensava nos caminhos e escolhas, nas decisões impensadas que insistira em tomar. Teve uma vida inteira para definir prioridades, mas escolhera pensar nelas na última volta da corrida.
A angústia é o que o leva a arrogância. A melhor defesa encontrada para confrontar todos os que pensavam poder lhe dizer o que fazer. Sua companhia é a praça, o banco, as rugas, os pombos e a solidão. Busca na quietude do silêncio uma forma de fugir do arrependimento pelas escolhas erradas e de tudo que não foi feito. Busca no vazio de si mesmo uma resposta para ter de ir tão longe. Por que precisamos viver até o tempo de nos arrependermos? Não seria melhor viver e morrer sem tempo para lamúrias advindas da especulação do que nunca aconteceu?
O ciclo segue. Prossegue com a rotina de lágrimas secas, que suas conjuntivas envelhecidas não mais produzem. Sem o paladar doce de degustar a vida e seus prazeres. Sobrevive somente para lembrar que um dia a sua própria biologia lhe permitira o cheiro da vivacidade. Convive com a presença sarcástica e cruel do abandono daqueles que alimentou e viu crescer. Sobrevive...
Hora apoiando as mãos sobre o joelho que lidera as pernas cruzadas, hora posicionando sua boina de forma a proteger sua catarata da luz solar, sempre se vê diante da mesma parede de pensamentos assentados como tijolos: Por mais que mudasse o início, por mais que fizesse diferente o meio, ali, exatamente ali, daquele mesmo jeito, seria esculpida alguma forma de arrependimento para o fim.
Norhan Sumar

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Cortinas


Abre as cortinas pra mim?
deixa-me adentrar teu palco de drama
pra mudar o fim da trama
e colocar sorrisos no rosto do público
findar de vez essa súplica infame
ser cúmplice dos teus crimes
fazer rimas, mesmo que elas não rimem
fazer amor, mesmo que o amor engane