segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Pessoa "de bem"

Em uma roda de amigos, numa daquelas conversas informais, oportunidade ímpar de aprendizado e crescimento: falávamos de futebol, relacionamentos, proeminências corporais femininas exaltadas pelo “clube do bolinha”, entre outros assuntos que poucas vezes envolviam política.
Entretanto, umas das afirmações enquanto falávamos (bem, é claro) de um ser social, curiosamente chamou minha atenção: “ah, fulano é do bem, eu gosto dele”.
Diante do exposto, claro que a conversa continuou, muito embora a reflexão a respeito desta afirmação tenha feito com que eu perdesse alguns minutos de sono.
Ora, o que seria uma pessoa do bem nos dias atuais? Um Super Astro de dezesseis anos que canta músicas cujas letras e seus significados as suas fãs brasileiras mal conhecem? Um vampiro gelado, que por opção não mata gente? Um lobisomem quente, que por opção não gosta do vampiro gelado e quer a qualquer custo a sua namorada? Alguns sujeitos que usam calças coloridas e cabelos propositalmente bagunçados (sem ofensas), além de cantar músicas que fazem envergonhar um admirador da boa e velha (mas muito enxuta) MPB? Alguém com um exemplar do livro mais vendido do mundo embaixo do braço, que anda por aí abençoando a alguns, julgando as preferências de alguns outros e repreendendo tudo que vá de encontro aos seus preceitos e crenças? Ou alguns dos vários outros exemplos que poderiam ser considerados e mencionados dentro deste padrão.
Se mentir um pouquinho, mesmo que seja pra arrancar um sorriso sincero e repleto de gratidão de um amigo ou inimigo, me excluir dessa lista – feito; Ficar com preguiça quando acordar de manhã no dia de realizar aquele trabalho voluntário com crianças em risco social que tanto me cativam – eu sou um péssimo exemplo; Invejar alguém por mais esdrúxulo que seja o motivo (lembrando dos ensinamentos advindos da boa educação que tive, onde se falava que não devemos prejudicar ninguém pela busca de interesses pessoais) – ta bom, já passei por isso também; Usar as roupas que eu quiser (tudo bem que não assustam tanto assim); ouvir as músicas que eu quiser, mesmo que estas não façam parte do top 10 da rádio mais ouvida entre minha faixa etária; não agradar a todos devido a uma sinceridade que, por vezes, me faz ser indelicado; ter opinião e não calar diante de um assunto que possa se tornar um debate; ser crítico com o que leio, assisto, ouço, vivo, convivo. Que seja, não quero ser do bem, tampouco “de bem”. Quero que o mal esteja presente em minhas atitudes e pensamentos, até porque o bonzinho, sem pensamentos malévolos (mesmo que sejam só pensamentos), cujo perfil de mocinho chega a dar náuseas, é chato demais pra quem quer viver a vida em sua plenitude, consumindo os minutos, os segundos, antes que eles consumam as suas oportunidades.
Dê-me a chance de ser mal, hora mal-sucedido, outrora mal educado, quiçá mal vestido ou mal falado. Dê-me o direito de fazer o bem, mas sem ser “do bem”, pois levar uma vida respeitando os que me respeitam, ajudando no que puder para a garantia de acesso de todos aos direitos constitucionais com universalidade, equidade, integralidade, fazem de mim um cidadão que talvez não seja uma pessoa “de bem”, mas sim uma pessoa cujas ressacas morais não me tragam noites mal dormidas.

                                                                       Norhan Sumar 
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sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Elas e seus encantos

Eu sou um eterno apaixonado por elas. Desde os tempos de moleque, descalço, consumindo toda paciência daquela que me concebeu, o mundo que elas oferecem já me fazia enlouquecer.
Tem a imponência das mais cumpridas, o charme das menores, a impiedade das que fazem chorar, as que alegram o ambiente, as difíceis, as que andam na boca do povo, enfim, os seus encantos são inúmeros, imensuráveis.
Andar pelas ruas, por mais inocente que seja a caminhada, torna-se uma viagem por um mundo de infindáveis tentações. Hora atraído pela criatividade imposta por algumas, hora deslumbrado pela roupagem utilizada por outras, quem sabe até intrigado pela feiúra de uma minoria infeliz.
Já perdi as contas de por quantas vezes as minhas companhias, por mais atenciosas e maravilhosas que fossem, se encontraram falando sozinhas enquanto eu admirava as formas de umas e outras que passavam diante dos meus olhos. É incontrolável! Viver neste País, cujas ruas são uma vitrine de variedades e encantamentos é uma árdua missão de resistência e, concomitantemente, uma experiência inigualável de beleza.
Pena não serem tantos os admiradores delas; pena não achar em cada esquina alguém que as conheça ou queira conhecer em sua plenitude; pena não haver na educação deste país muitos elementos que nos ensinem a amá-las pelo que elas são; pena termos que admira-las a nossa maneira, enquanto o poder público parece não dar a mínima para sua execração. E quando digo conhecer, não quero dizer defini-las primorosamente, mas sim entender o seu papel, o seu lugar, a sua magnitude e inquestionável importância.
É papel nosso disseminar o quão belo elas são, o quão fantástico pode ser mergulhar neste mundo de maravilhas que as palavras podem oferecer. Ah sim, as palavras! Tão desprezadas por muitos e esquecidas por muitos outros, que as repetem sem ao menos dar o valor que elas merecem.
Não que seja necessário gostar das mais difíceis ou das mais pomposas, mas que a admiração por elas seja intrínseca, natural e cotidiana. Que elas estejam presentes nos nossos hábitos, nas nossas listas de admiração. Que então, lembremos do imenso poder que elas têm, e mostremos para quem está adentrando agora esse mar revolto e infinito das palavras a melhor forma de usá-las: a que você quiser. 

                                                                                             Norhan Sumar


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Elas e seus encantos de Norhan Sumar é licenciado sob uma Licença Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivs 3.0 Unported.

sábado, 7 de agosto de 2010

Patriotismo cansado

Quisera eu viver nos dias do verdadeiro patriotismo. Patriotismo outrora definido como o sentimento de amor e devoção à pátria e seus símbolos. Patriotismo que nos impedia de sobrepor os interesses nacionais por concepções pífias e superficiais acerca de nações outras que nunca nos olharam com olhos de admiração.
Quisera eu viver em tempos onde orgulhar-se publicamente de ser brasileiro não acompanhasse uma necessidade intrínseca de dar explicações para tal.
Foi-se o tempo em que aclamávamos um Brasil que vai além de belezas naturais e corpos físicos, onde os músculos mascaram a verdadeira essência do intelecto.
Foi-se o tempo em que admirávamos a boa música, a boa culinária, o bom caráter e quiçá a maneira ímpar de levar a vida como um bon vivant.  Tempos em que olhávamos para os filhos deste solo e os declarávamos afortunados por isso.
Sinto que já passou da hora de reavivarmos os nossos sentimentos, de renovarmos os nossos argumentos, para que nossa única e empobrecida maneira de demonstrar amor à pátria não seja apenas de quatro em quatro anos (Eleições? Não. Futebol).
Sinto que já passou da hora de pararmos de instruir os nossos filhos a abrirem o jornal para descobrirem os próximos capítulos da novela. Mas que eles abram as páginas do conhecimento para a consciência crítica de que eles é que comandam esta nação e definirão os caminhos, tortuosos ou não, que esta seguirá.
Levanta-te então, ó pátria amada! E verás que os filhos teus têm fugido à luta. Atenta-te e verás que os filhos deste solo vêm traindo a mãe gentil. Os filhos deste solo, tão filhos quanto todos nós, tem trocado os berços esplêndidos por berços de ouro, o nosso ouro.
A pátria somos nós, todos nós. E é inadmissível que tenhamos que assistir, das nossas acomodações desconfortáveis, porém nossas por direito, que o patriotismo recebe tão pouco e está tão cansado quanto o trabalhador brasileiro.
                                                                                          Norhan Sumar
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quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Balbúrdia

Vivemos num mundo onde o certo deixou de ser louvável. A impunidade parece ser a recompensa de quem rouba mais. Assassinos da esperança, carrascos da ética e imperadores da corrupção têm a nossa confiança confirmada sempre que precisam. E mais quatro anos postergarão as nossas escolhas mal-sucedidas.
Quem seriam os culpados então? Os protagonistas da mais absurda e cômica peça teatral? Seríamos nós? O público, que desconhece os conceitos de cidadania, cognitivamente massacrados, que por isso escolheram os mestres da vergonha como artistas principais.
A dinâmica deturpada da estrutura social vem levando grande parte da massa que sua, dia após dia, a conhecer perfeitamente o perfil do mocinho da novela. Muito embora não façam idéia de quem seja o cacique que comanda essa balburdia, tampouco os elementos que subsidiam as suas insanidades.
Ninguém sabe o que esperar. Mas espero e ajo para que isso mude. Aguardo ansiosamente a reforma advinda dos braços fortes de quem vai à luta, e de maneira atroz, voraz, feroz, mostra que a vontade de mudar é o primeiro e mais importante passo para que possamos fechar as cortinas de quem pensa que atuar por nós é brincadeira.
                                                     
Por: Norhan Sumar
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