domingo, 6 de fevereiro de 2011

Avalanche de descaso

Povo miserável! Destemido, mas desprovido. Não é somente a rotina maçante e massacrante desse povo que se repete a cada dia. Suas histórias se repetem a cada vida e suas mazelas se fazem uma constante. Vez por outra sou obrigado a ouvir que é por escolha própria a miséria vivida; que é opcional sofrer tanto e padecer dessa falta cruel de oportunidade. Ouvir isso já foi revoltante para mim: quando eu ainda acreditava no ser humano.
Não tenho a solução. Quem dera se a tivesse. Hoje eu apenas lamento, choro, sofro, alimento a minha indignação a cada morte sem motivo, a cada lamúria de uma mãe, a cada descaso do poder público, a cada descaso civil (quão normal é isso - basta olhar para o lado), a cada dia em vão, a cada palavra não dita.
Muitos motivos são aceitáveis para justificar a morte. Mas não encaremos com tristeza superficial a morte de centenas de pessoas que "erraram" por estar em casa. Ouve-se por aí que morar nessas condições é uma opção, que estar susceptível às consequencias advindas das tormentas naturais é questão de escolha. Afirmo que não é. Ninguém reside um barraco beirando uma encosta em risco porque gosta ou porque quer. Mas essa gente não tem alternativa. Defende-se, é claro, dizendo que se orgulham de suas comunidades e suas residências. Muitas vezes é tudo que eles têm, portanto é o que eles defendem com afinco e braço forte. Não sejamos tolos e ignorantes de afirmar que alguém mereça morrer por gostar de sua moradia, que estão errados ao lutar por aquilo que construíram à custa de muito suor e de salários pífios que pagam os nossos empregadores. Fossem dadas condições de moradia adequadas e dignas, que certamente melhor seria o destino dessas pessoas.
Centenas de vidas interrompidas pela morte. Seja como diz James Lovelock ao afirmar que a Terra (Gaia) responde fisiologicamente às nossas agressões diárias e ininterruptas, seja como dizem os religiosos que atribuem ao divino tamanha crueldade, seja como dizem os que jogam no meu time que apenas acham que essas pessoas miseráveis não tem escolha a não ser se submeter a tais riscos. É hora de levantar da cadeira empoeirada e cobrar que algo seja feito por essas pessoas. Ou será que esperaremos a próxima "resposta" de Gaia e os próximos quinhentos mortos para fazer alguma coisa?
            Não é possível que esse povo miserável tenha que sofrer com a cena de suas casas e seus pertences sob a lama. Não é possível que a lama que recobre a política nacional tenha que se omitir diante dessa gente e deixar que isso aconteça ano após ano. Não é possível que continuemos muito acomodados e pouco incomodados com todo esse sofrimento. Não é possível que tenhamos que achar normal a morte de tanta gente. Acorda! A sua casa e sua vida já estão sob tamanha lama e você ainda não se deu conta. A lama de descaso e corrupção é jogada sobre nossas cabeças todos os dias e o que nós fazemos? Esperamos com o mesmo descaso a próxima chuva. 
Norhan Sumar

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