Ela gostava de enfeitiçar, mas talvez não soubesse. Ou apenas não fizesse por mal. Mas sua beleza era algo inexplicável: parecia ter sido pintada numa tela pelo melhor dos artistas e insistia em ganhar vida com traços perfeitos - entre seu sorriso e seus gestos delicados e precisos estavam escondidos os mais poderosos artifícios para fazer alguém se apaixonar.
Ao que me parece, lendo os anais dessa famigerada estória, o encanto estava em sua presença. E não se podia atribuir tal façanha a uma beleza de corpo físico. Ela encantava em gestos e trejeitos. Comentava-se que até mesmo a Marcela – de “Dom Quixote de La Mancha” – a mesma que enfeitiçou Crisóstomo e tantos outros pastores se sentiria envergonhada e de pouca beleza diante daquelas bochechas coradas por um sorriso de olhar brilhante.
“Nem pense nisso!” diziam os mais entendidos ao saber das intenções ou interesses de algum desavisado. “Com essa aí até o Don Juan sairia derrotado” – era o que se comentava quando seu perfume anunciava sua chegada.
Certa noite, quando a arrebatadora da paz (carinhosamente chamada por um de seus amantes) chegou naquele bar, vestindo apenas um jeans e uma camiseta – o suficiente para destronar a Kate Middleton – foi que se iniciou o mais interessante dos duelos:
Um duelo de amor pode não ter armas, mas deixam cicatrizes mais dolorosas que as marcas de uma guerra.
“Quem é essa?” – perguntou o mais novo desavisado. Ficou nítido o espanto de seus amigos diante da pergunta.
“Você não gostaria de saber, garanhão!” – Antes que ele pudesse concluir sua resposta o desavisado levantou-se e caminhou de vagar até a moça. Foi uma cena curiosa, pois quando ela se virou deixou faltar algo: o sorriso.
Ela não sorriu como o de costume. Parecia estar guardando a sua mais valiosa arma para o final daquele embate. “Deve ser por isso que todo mundo tem medo de você aqui. Séria assim você pode acabar afastando alguém interessante.” – Atreveu-se o forasteiro.
Foi então que ela escolheu as armas da batalha – sorriu graciosamente – “E se for essa a intenção?” – respondeu sem se alongar. Mas não foi preciso mais do que seis palavras para fazer ecoar aquela voz que parecia controlar os sentidos do interlocutor.
“Então deu certo. Porque eu confesso que não sou muito interessante.” – Argumentou.
Os dois sorriram e conversaram durante horas a fio, como se não houvesse mais ninguém ao seu redor.
Mal terminou a conversa, prometendo continuá-la em outro momento, o atrevido foi recebido pela intervenção do amigo: “Cara, essa carrasca gosta de arruinar a vida de homens de bem.”
“Isso já me isenta desse mal. Porque eu bem sei que faz algum tempo que o bem e eu andamos afastados.”
“Tudo bem, durão. Quando você precisar chorar por causa d’ela, eu pago o drink.” - Retrucou o amigo.
“Ótimo. Achei que você nunca fosse oferecer.” - Sorriu ao responder e ver que seu companheiro não conseguia esconder sua reprovação.
Muitos foram os drinks pagos pelo amigo adivinhão. Nem tantos foram os choros, mas o sofrimento lhe parecia conveniente. Ela era uma adversária primorosa; conhecia excelentemente ou instintivamente bem os caminhos que trilham a paixão e o amor. E parecia evitá-los como um toureiro evita os chifres do touro – com bem mais charme e graciosidade. O forasteiro, por sua vez, achou um motivo para lutar, para viver. E, ao contrário do que muitos dizem, acho que ele vivia bem por morrer de amor.
Norhan Sumar
2 comentários:
Simplesmente demais!!Amei... Bjs querido!!
nice : ]
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